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quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

#10 Lirismos: Cinzento – Florbela Espanca


Postagem: Eric Silva
Poeiras de crepúsculos cinzentos,
Lindas rendas velhinhas, em pedaços,
Prendem-se aos meus cabelos, aos meus braços
Como brancos fantasmas, sonolentos...

Monges soturnos deslizando lentos,
Devagarinho, em misteriosos passos...
Perde-se a luz em lânguidos cansaços...
Ergue-se a minha cruz dos desalentos!

Poeiras de crepúsculos tristonhos,
Lembram-me o fumo leve dos meus sonhos,
A névoa das saudades que deixaste!

Hora em que o teu olhar me deslumbrou...
Hora em que a tua boca me beijou...
Hora em que fumo e névoa te tornaste...


Sobre o autor

Florbela Espanca ou Florbela d'Alma da Conceição Espanca é o pseudônimo da poetisa portuguesa Flor Bela Lobo. Nasceu em Vila Viçosa, Portugal, no dia 8 de dezembro de 1894 e faleceu em Matosinhos, no dia de seu aniversário de trinta e seis anos (8 de dezembro de 1930) por conta de uma overdose de barbitúricos – sua terceira tentativa de suicídio. Em vida, buscou transformar sua experiência pessoal tumultuosa, inquieta e cheia de sofrimentos íntimos em poesia de alta qualidade, carregada de erotização, feminilidade e panteísmo.


Poema extraído da obra Livro de Soror Saudade, publicado em 2013, pelo Projeto Adamastor que disponibiliza obras literárias em portuguesas em domínio público.













quarta-feira, 8 de novembro de 2017

#9 Lirismos: Romance II ou Do ouro incansável – Cecília Meireles

Postagem: Eric Silva

Mil bateias Vão rodando
sobre córregos escuros;
a terra vai sendo aberta
por intermináveis sulcos;
infinitas galerias
penetram morros profundos.

De seu calmo esconderijo,
O ouro vem, dócil e ingênuo;
torna-se pó, folha, barra,
prestígio, poder, engenho..
É tão claro! - e turva tudo:
honra, amor e pensamento.

Borda flores nos vestidos,
sobe a opulentos altares,
traça palácios e pontes,
eleva os homens audazes,
e acende paixões que alastram
sinistras rivalidades.

Pelos córregos, definham
negros, a rodar bateias.
Morre-se de febre e fome
sobre a riqueza da terra:
uns querem metais luzentes,
outros, as redradas pedras.

Ladrões e contrabandistas
estão cercando os caminhos;
cada família disputa
privilégios mais antigos;
os impostos vão crescendo
e as cadeias vão subindo.

Por ódio, cobiça, inveja,
vai sendo o inferno traçado.
Os reis querem seus tributos,
- mas não se encontram vassalos.
Mil bateias vão rodando,
mil bateias sem cansaço.

Mil galerias desabam;
mil homens ficam sepultos;
mil intrigas, mil enredos
prendem culpados e justos;
já ninguém dorme tranqüílo,
que a noite é um mundo de sustos.

Descem fantasmas dos morros,
vêm almas dos cemitérios:
todos pedem ouro e prata,
e estendem punhos severos,
mas vão sendo fabricadas
muitas algemas de ferro.



Sobre o autor

Cecília Benevides de Carvalho Meireles foi uma jornalista, pintora, poetisa e professora brasileira. Nasceu na cidade do Rio de Janeiro, em 7 de novembro de 1901 e ali faleceu em 9 de novembro de 1964. Lançou seu primeiro livro de poemas, Espectros, em 1919, quando ainda tinha dezoito anos de idade. Participou do grupo literário da Revista Festa, de caráter católico, conservador e anti-modernista. Atuou como professora em várias universidade no Brasil e no exterior, e, na Universidade do Distrito Federal, lecionou Literatura Luso-Brasileira. Sua obra foi traduzida em vários países e é considerada a primeira mulher de grande expressão na literatura brasileira.
 






Poema extraído do livro Romanceiro da Inconfidência, publicado em 2013, pela editora Global.







quarta-feira, 11 de outubro de 2017

#8 Lirismos: Biografia – Ulisses Tavares

Postagem: Eric Silva

Quando sozinho, sofro.
Com gente, finjo.
Se amado, fujo.
Amante, disfarço.
Permanecendo, inquieto.
Calado, penso.
Pensando, calo.
Tocado, tremo.
Tocando, recuo.
Vencedor, desinteresso.
Vencido, odeio.
Quase morto,
Vivo assustado.
Quase vivo,
Morro de medo.


Sobre o autor

Ulisses Tavares é poeta, professor, publicitário, jornalista, dramaturgo, compositor, roteirista e ator brasileiro. Nasceu no dia 08 de maio de 1950, na cidade de Sorocaba, Estado de São Paulo. É formado em Publicidade e Tecnologia da Informação. Publicou seu primeiro livro de poesias em 1977. Hoje tem 112 livros publicados e mais de 20 milhões de exemplares vendidos.








Poema extraído do livro Diário de Uma Paixão, publicado em 2003, pela editora Geração.





segunda-feira, 11 de setembro de 2017

#7 Lirismos: Soneto de Separação – Vinicius de Moraes

Postagem: Eric Silva
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.


Sobre o autor

Vinicius de Moraes foi um poeta, dramaturgo, jornalista, diplomata, cantor e compositor brasileiro. Nasce na cidade do Rio de Janeiro, em 19 de outubro de 1913, e morreu na mesma cidade no dia 9 de julho de 1980. Ficou famoso por seus sonetos e pelo lirismo de sua obra poética, contudo seu trabalho é vasto e compreende desde a literatura até o teatro, o cinema e a música. Sua composição "Garota de Ipanema", feita em parceria com Antônio Carlos Jobim, é considerado como um hino da MPB.
















Poema extraído do livro Antologia Poética, publicado em 1976, pela editora J. Olympio.





segunda-feira, 4 de setembro de 2017

#6 Lirismos: Eu em mim – Carlos Queiros Telles

Postagem: Eric Silva
Enfim,
este é meu corpo,
flor que amadureceu.

Estalo os dedos,
é sonho.
Respiro fundo,
é brisa.

Estendo os braços,
é asa.
Libero as fibras,
é voo.

Esperança resolvida
verso que ficou pronto.
Meu corpo é assim.

Olho seu rosto,
mistério.
Ouço sua voz,
estrangeira.
Cheiro seu suor,
lembranças.
Sinto sua pele...
sou eu!

Sou eu
para a dor e o prazer,
para o sabor e o saber,
para emoção de viver
viagem tão companheira...
Sou eu sim,
sou eu assim,
sou eu enfim
com meu corpo
em mim!


Sobre o autor

Carlos Queiroz Telles foi escritor, poeta, e dramaturgo brasileiro. Nasceu em São Paulo 9 de março de 1936 e faleceu naquela mesma cidade no dia 17 de fevereiro de 1993. Trabalhou como jornalista e publicitário, tendo sido também professor universitário e diretor da TV Cultura. É um dos fundadores do grupo Teatro Oficina, mas além de dramaturgo escreveu novelas para a televisão. Foi ganhador de dois prêmios Molière nos anos de 1972 e 1976.












Poema extraído do livro Sonhos, grilos e paixões, publicado em 1990, pela editora Moderna.





domingo, 20 de agosto de 2017

#5 Lirismos: O Cântico da Terra – Cora Coralina

Postagem: Eric Silva
Em homenagem aos 128 anos de nascimento de Cora Coralina

Eu sou a terra, eu sou a vida.
Do meu barro primeiro veio o homem.
De mim veio a mulher e veio o amor.
Veio a árvore, veio a fonte.
Vem o fruto e vem a flor.

Eu sou a fonte original de toda vida.
Sou o chão que se prende à tua casa.
Sou a telha da coberta de teu lar.
A mina constante de teu poço.
Sou a espiga generosa de teu gado
e certeza tranquila ao teu esforço.
Sou a razão de tua vida.
De mim vieste pela mão do Criador,
e a mim tu voltarás no fim da lida.
Só em mim acharás descanso e Paz.

Eu sou a grande Mãe Universal.
Tua filha, tua noiva e desposada.
A mulher e o ventre que fecundas.
Sou a gleba, a gestação, eu sou o amor.

A ti, ó lavrador, tudo quanto é meu.
Teu arado, tua foice, teu machado.
O berço pequenino de teu filho.
O algodão de tua veste
e o pão de tua casa.

E um dia bem distante
a mim tu voltarás.
E no canteiro materno de meu seio
tranqüilo dormirás.

Plantemos a roça.
Lavremos a gleba.
Cuidemos do ninho,
do gado e da tulha.
Fartura teremos
e donos de sítio
felizes seremos.


Sobre o autor

Cora Coralina é o pseudônimo de Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, poetisa e contista brasileira. Nascida na Cidade de Goiás, no dia 20 de agosto de 1889, Cora Coralina faleceu em Goiânia, no dia 10 de abril de 1985 quando tinha 95 anos de idade. É considerada uma importante escritora brasileira, mas só teve seu primeiro livro publicado em 1965 quando já tinha quase 76 anos de idade. Durante sua vida trabalhou como doceira e compunha suas poesias enquanto trabalhava. Mulher simples, sua obra se caracteriza pela poética rica em temas cotidianos do interior do país.








Poema extraído do livro Poemas dos becos de Goiás e estórias mais, publicado em 1997, pela editora Global.





segunda-feira, 14 de agosto de 2017

#4 Lirismos: Tudo, todos e o todo – Carlos Rodrigues Brandão

Postagem: Eric Silva

Somos feitos de barro e de fogo
e por isso somos o desejo e o amor.
Fomos feitos de terra e de água
e assim somos eternos como a vida
e somos passageiros como a flor.
Somos a luz, a sombra, o clarão, a escuridão
a memória de deus, a história e a poesia.
Somos o espaço e o tempo, a casa e a janela
e a noite e o dia, e o sol e o céu e o chão.

Somos o silêncio e o som da vida.
O estudo, a lembrança e o esquecimento.
Somos o medo e o abandono.
A espera somos nós e somos a esperança.
Pois não somos mais e nem menos do que tudo.
Somos o perene e o momento, a pedra e o vento
a energia e a paz, a vida criada e o criador.

Somos o mundo que sente, e irmãos da vida
somos a aventura de ser vida e sentimento.
E assim em cada ave que voa há nossa alma
e em cada ave que morre, a nossa dor.



Sobre o autor

Carlos Rodrigues Brandão nasceu no Rio de Janeiro. É psicólogo, mestre em antropologia e doutor em ciências sociais e divide sua produção escrita entre a área científica e a literatura, tendo publicado mais de oitenta obras. Recebeu o Prêmio Poesia-Liberdade pela Fundação Centro Alceu Amoroso Lima, entre várias outras condecorações por seu trabalho científico. É professor emérito da Universidade Federal de Uberlândia e pesquisador do CNPq.








Poema extraído do livro O Jardim de Todos, publicado em 2007, pela editora Autores Associados.





segunda-feira, 24 de julho de 2017

#3 Lirismos: Praia do Caju – Ferreira Gullar

Postagem: Eric Silva
Escuta:
o que passou passou
e não há força
capaz de mudar isto.

Nesta tarde de férias, disponível, podes,
se quiseres, relembrar.
Mas nada acenderá de novo
o lume
que na carne das horas se perdeu.

Ah, se perdeu!
Nas águas da piscina se perdeu
sob as folhas da tarde
nas vozes conversando na varanda
no riso de Marília no vermelho
guarda-sol esquecido na calçada.
  
O que passou passou e, muito embora,
voltas às velhas ruas à procura.
Aqui estão as casas, a amarela,
a branca, a de azulejo, e o sol
que nelas bate é o mesmo
sol
que o Universo não mudou nestes vinte anos.





Caminhas no passado e no presente.
Aquela porta, o batente de pedra,
o cimento da calçada, até a falha do cimento. Não sabes já
se lembras, se descobres.
E com surpresa vês o poste, o muro,
a esquina, o gato na janela,
em soluços quase te perguntas
onde está o menino
igual àquele que cruza a rua agora,
franzino assim, moreno assim.
Se tudo continua, a porta
a calçada a platibanda,
onde está o menino que também
aqui esteve? aqui nesta calçada
se sentou?

E chegas à amurada. O sol é quente
como era, a esta hora. Lá embaixo
a lama fede igual, a poça de água negra
a mesma água o mesmo
urubu pousado ao lado a mesma
lata velha que enferruja.
Entre dois braços d’água
esplende, a croa do Anil. E na intensa
claridade, como sombra,
surge o menino
correndo sobre a areia. É ele, sim,
gritas teu nome: “Zeca,
Zeca!”
Mas a distância é vasta
tão vasta que nenhuma voz alcança.

O que passou passou.
Jamais acenderás de novo
o lume
do tempo que apagou.




Sobre o autor

Ferreira Gullar, pseudônimo de José Ribamar Ferreira, foi escritor, poeta, crítico de arte, biógrafo, tradutor, memorialista e ensaísta brasileiro. Nasceu em 10 de setembro de 1930, na cidade de São Luís do Maranhão e faleceu em 04 de dezembro de 2016, na cidade do Rio de Janeiro. Foi militante do Partido Comunista Brasileiro, posicionamento político que se reflete em muitas de suas poesias, e por isso foi exilado pela ditadura militar. Viveu na União Soviética, na Argentina e no Chile. O poeta é considerado um dos fundadores do neoconcretismo e foi escolhido para ocupar a cadeira nº 37 da Academia Brasileira de Letras em 2014.







Poema extraído do livro Melhores Poemas Ferreira Gullar, seleção de Alfredo Bosi, publicado em 2006, pela editora Global.





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