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sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

Descolorindo Eloáh – Felipe Saraiça – Resenha

 Por Eric Silva

15 de janeiro de 2022, ano de Moçambique

Transexualidade é a sintonia que une feixes de luzes desassociados entre si para ajustar o foco de maneira nítida e real. Não configura uma aberração e nem caracteriza um ser bizarro.

O gênero de uma pessoa é apenas uma condição que não afeta sua alma, seus sentimentos, crenças e tão pouco seu caráter.”

Luiza Gosuen

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Abordando um tema cujo debate é tão polêmico quanto necessário, o escritor brasileiro, Felipe Saraiça publica, em 2019, pela Editora Pendragon, um livro cujo título chama a atenção pelo tom poético e até certo ponto melancólico e com uma capa tão bela quanto delicada. Mas mais do que isso, o faz nos primórdios de um momento obscuro da história de nosso país, no qual a intolerância, a ignorância, o fanatismo e o radicalismo vem endurecendo corações de muitos contra a causa LGBTQIA+. Saraiça não podia ter escolhido momento melhor para fazê-lo.

Descolorindo Eloáh apesar de algumas falhas literárias é uma obra importante porque discute a transexualidade por uma dimensão ainda pouco debatida: a relação entre fé e sexualidade. Um debate que precisa ser aprofundado, porque ainda é gestora de aberrações como a terapia de reversão sexual, ou, no popular, “cura gay”, abordada pelo autor em seu livro.

Sinopse do enredo

Quando Eloáh nasceu seu pai, Silas, escolheu seu nome porque significava literalmente Deus, um nome um tanto incomum para um menino, mas que refletia a imagem de religioso e de pastor respeitado da pequena Cidade de Confete que Silas desejava construir. A esposa havia desejado uma menina, mas a chegada de um garoto encheria o pai de felicidade e de orgulho. E por um tempo foi bom.

As coisas, no entanto, começaram a ruir quando a pequena Eloáh, ao saber por sua mãe que todos na família esperavam que nascesse uma menina, questionou inocentemente ao pai se ela poderia ser menina quando crescesse. A aquele foi o último dia que Silas olhou com amor a própria criança e o marco inicial de sua cruzada por eliminar o que para ele era repulsivo, inaceitável e danoso ao seu status social: a identidade transexual de Eloáh. Era necessário “curá-lo”, ainda que isso custasse destruir todos a sua volta, inclusive a filha.

Agora, com 17 anos de idade e flertando rotineiramente com o desejo de suicidar-se, Eloáh enfrenta todos os dias a submissão, o silêncio e a omissão de sua mãe em relação aos excessos violentos de Silas. Uma situação que reforça na cabeça da jovem a certeza que não existe amor para ela naquela casa, apenas o desejo insano de seu pai em preservar as imagens de pastor e de família perfeita e conservadora que com muita falsidade, talento teatral e hipocrisia ele construiu ao longo do tempo.

Sentindo que não há lugar para ela na vida, Eloáh vivencia na pele um circo de horrores cujo espetáculo se repete diariamente, tendo como palco principal a casa onde vive, mas também a escola onde é obrigada a conviver com o bullying e com a impunidade de seus agressores que atuam protegidos por seus sobrenomes e status sociais.

Resenha

Descobri esse livro por acaso, no Twitter, em uma publicação da editora que naquela ocasião fazia uma promoção de alguns dos seus ebooks.

Nunca havia ouvido falar de seu autor e nem de sua obra, mas de imediato Descolorindo Eloáh me chamou a atenção pelo título criativo e sugestivo emoldurado por um delicado desenho que fazia supor uma aquarela. E caso você não saiba, aquarelas perdem parte de suas cores ao secarem e com o tempo podem desbotar (sobretudo as aquarelas líquidas de má qualidade); isso faz das cores de uma aquarela recém pintada uma beleza efêmera e mutável. Sugestivo, não? Por isso, não perdi tempo em adquirir minha cópia deste e de outros livros de Felipe, mas comecei minha excursão por esta que aparentemente é a segunda obra publicada pelo autor, tendo estreado apenas três anos antes com o livro Palavras de rua.

Adianto que gostei e não gostei de Descolorindo Eloáh, o que ironicamente me deixou tão dividido quanto a própria Eloáh. E para que as coisas fiquem mais claras dividirei a resenha em dois tópicos. O primeiro abordando a relevância política desta obra e o segundo apontando minha apreciação crítica da obra em quanto peça literária.

Descolorindo Eloáh como obra com relevância política

Não é nenhuma novidade que a questão LGBTQIA+ é permeada por lutas, tabus, polêmicas e muito desconhecimento. O Brasil é um dos países que mais matam homossexuais e transexuais no mundo, e o conservadorismo religiosos muito presente no país pouco contribui na convivência sobretudo familiar destas pessoas. Tudo isso num contexto no qual a família é o principal porto seguro para o desenvolvimento equilibrado e saudável de uma pessoa LGBT.

Não estou aqui com a pretensão de criticar nenhuma religião, mas é nítido que muitos discursos proferidos pelo país usam os escritos sagrados como escudos para camuflar preconceitos e intolerância, quando a palavra de ordem no cristianismo é o AMOR. E quando falta amor e entendimento numa família que tem uma pessoa LGBT, os problemas de ansiedade e depressão, de uso abusivo de substâncias lícitas e ilícitas e o desejo de cometer suicídio[1] são muito maiores e frequentes, porque estas pessoas não só enfrentam desafios dentro de suas casas, mas sobretudo fora delas onde são alvos corriqueiros de preconceito, discriminação e violência. E quando se fala de Brasil, o que mais há é muito desconhecimento sobre a complexidade da sexualidade humana e de seus gêneros; pouca disposição para um debate saudável e racional da questão, e abundantes quantidades de preconceito, discriminação, homofobia e transfobia impregnadas em muitas das esferas que compõem a sociedade brasileira, sejam elas religiosas ou não.

Falar de homossexualidade, de bissexualidade, de transexualidade ou de transgênero é ainda difícil e, por vezes, perigoso. Isso torna a discussão penosa, bem como torna árduo explicar o quão complexas são a sexualidade e a identidade de gênero do ser humano, sendo elas compostas por muitas matizes e com fronteiras muito tênues.

A tendência é partir para uma simplificação tosca que insiste em enquadrar sexualidades e gêneros em caixinhas rígidas e pré-moldadas que só reconhecem a existência de dois gêneros definidos biologicamente e de duas sexualidades – heterossexualidade e homossexualidade –, sendo a primeira considerada como legítima e natural e a segunda, como marginal, anormal e pecaminosa. Desta concepção cria-se um sistema social discriminativo ao qual se dá o nome de heteronormatividade.

Em muitos países a homossexualidade é criminalizada e a transgeneridade é vista como distúrbio mental. Até recentemente a Organização Mundial de Saúde (OMS) mantinha a transgeneridade na lista de doenças mentais presente no manual de Classificação Internacional de Doenças (CID)[2]. Só em 2018 a Suprema Corte da Índia decidiu revogar uma decisão de 2013 que validava uma lei britânica de mais de 150 anos e que, na prática, criminalizava a homossexualidade no país. O próprio Reino Unido só descriminalizou completamente a homossexualidade em 1982[3], quando a Irlanda do Norte foi seu último "país constituinte" a fazê-lo. Esses são apenas três exemplos dos muitos e variados reflexos da heteronormatividade.

As consequências sociais, psicológicas e familiares para aqueles que não se enquadram nessa normatividade são terríveis, mas nem sempre visíveis. Mas das questões LGBTs pouco conhecidas pelo brasileiro médio, sem dúvida nenhuma, a questão da transgeneridade é uma das mais ignoradas – por vez até mesmo pela comunidade LGBTQIA+.

Em uma explicação grosseira, transgênero é o indivíduo que possui uma identidade de gênero que difere do que é considerado típico ao sexo atribuído ao nascer. Desta forma, o indivíduo transexual o qual ao nascer foi atribuído o sexo masculino, pode identificar-se com a identidade de gênero oposta a este sexo, sendo ela uma mulher trans.

Isso significa dizer que, a medida que se desenvolve, esse indivíduo olha para si no espelho e não vê em seu corpo correspondência com o que ele sente que realmente é e se identifica. Porque os gêneros masculino e feminino são muito mais uma construção histórica e social do que biológica, e se não fosse a pressão sociocultural, as pessoas perceberiam o quão complexo é o gênero. Um exemplo disso é o gênero fluído.  Pessoas que são fluídas de gênero ou não se identificam com um único papel de gênero ou com uma única identidade de gênero, ela acaba flui entre eles. Há ainda o caso daqueles cujo gênero muda de tempos em tempos.

O mesmo se dá com a sexualidade que pode ser mais ou menos flexível e as vezes fluídas.

É neste terreno que Felipe insere sua narrativa, criando para Descolorindo Eloáh uma protagonista transexual – tema ainda pouco representado na literatura LGBT –, e vai longe ao inserir na trama outras duas questões tangenciais, igualmente polêmicas e ainda menos exploradas (agora não só na literatura como socialmente): a relação entre fé, família e pessoas LGBTs e as terapias que prometem a reversão sexual.

Escrito como o diário de uma refém da intolerância, Descolorindo Eloáh narra pela voz de uma garota trans a sua rotina de terror psicológico, de violência física e simbólica perpetrada sobretudo por seu pai e por seus colegas de escola, e alimentado pela omissão da mãe e da escola.

O pai de Eloáh é pastor e profundamente homofóbico e transfóbico. Para ele a filha é uma aberração e seu comportamento, os sintomas de uma doença. Ele não perde uma oportunidade para hostilizar, humilhar e diminuir Eloáh. A situação doméstica é a pior possível: tóxica, violenta, sufocante.

Pelo fato de ser pastor poderíamos simplificar dizendo que ele rejeita a identidade de gênero da filha porque considera isso uma violação dos desígnios divino, concebendo-a como pecaminosa e antinatural. Mas é anda pior, porque é também uma questão de imagem e status social.

Silas é um homem corrupto, hipócrita e misógino que se esconde atrás da fé para criar uma imagem de bom moço e pessoa religiosa, logo, digna de mérito e respeito por ser um homem cristão que construiu uma família temente a Deus. Este homem que é respeitado pela cidade e que em casa se alcooliza, violenta psicologicamente a filha, trai, manipula e agride verbalmente a esposa, é o mesmo que lidera uma comunidade religiosa que – pelos indícios deixados pelo autor – tem a mesma visão distorcida sobre as questões de identidade de gênero e de sexualidade que seu pregador. Para esta comunidade, Silas necessita ser a verdadeira personificação da integridade, retidão e honestidade, e se esta é uma comunidade conservadora, ele também não pode ter como filho uma garota trans. Ela precisa “ser homem” e se comportar como “homem”. Aqui temos uma mistura perigosa e explosiva:  uma pessoa que considera a transegeneralidade (e também a homossexualidade) pecaminosa e antinatural e que necessita manter uma coerência entre o que prega e a imagem de si e da família que exibe à sociedade.

Ainda que tenha aqui corrido o risco de generalização, o autor denuncia uma das três posturas comuns das igrejas cristãs no Brasil em relação às uniões homoafetivas e que são descritas pelas pesquisadoras Daniele Trindade Mesquita e Juliana Perucchi[4]:

***

“De modo geral, as posturas das igrejas cristãs no Brasil em relação às uniões homoafetivas podem ser classificadas em três tipos: a rejeição à homossexualidade, concebendo-a como pecaminosa e antinatural. Assim, há o acolhimento dos/as homossexuais pela igreja, desde que eles/as reconheçam que precisam mudar seu comportamento. Outro tipo de postura encontrada no meio cristão é aquela que aceita a conduta homossexual, embora a considere inferior à heterossexual. Existem ainda os defensores da ideia de que a homossexualidade tem o mesmo nível de dignidade que a heterossexualidade (Jurkewicz, 2005). Dentre os três posicionamentos, o mais presente e disseminado é o primeiro, segundo o qual a homossexualidade estaria em um nível inferior na hierarquia das sexualidades (Rubin, 2003), o que justificaria o uso de dispositivos religiosos regulatórios e corretivos com os/as homossexuais. Esta postura é justificada muitas vezes por trechos da Bíblia, interpretados de forma literal pelos/as religiosos/as, de modo que não são consideradas a época histórica e a cultura em que os textos foram escritos originalmente. Dessa maneira, tanto o Antigo, quanto o Novo Testamento são reiterados para justificar a condenação aos homossexuais pelas igrejas. Trechos dos livros de Gênesis, Levítico e Coríntios são os mais citados, sendo que as narrativas de Sodoma e Gomorra e as cartas paulinas recebem destaque.

***

Eu ainda não havia visto na literatura alguém entrar neste terreno antes, mas pelas sinopses de seus outros livros é nítido que Felipe é atraído pelos temas difíceis e polêmicos, o que acho ótimo, porque é um deleite literário sair dos lugares comuns. Mas aqui, especificamente, a coragem de Felipe é tão digna de nota quanto a relevância que a obra ganha por três motivos iniciais: dar visibilidade a questão trans e pôr na mesa o preconceito religioso contra os LGBTs, bem como muitas vezes a fé é usada como justificativa para a violência psicológica e moral contra estas pessoas.

Mas não para por aí. Silas tenta “corrigir” sua filha, ou melhor, “curá-la” através de um tratamento psicológico duvidoso com uma psicóloga tão amoral e antiética que faz arrepiar os cabelos de qualquer profissional da área. Eloáh é submetida ao que o jargão médico chama de Terapia de Reorientação Sexual (chamada ainda terapia de conversão, terapia reparativa ou terapia de reversão sexual), ou como no popular: cura gay. Uma falsa medicina que parte da ideia de que a homossexualidade e a transgeneridade são patologias, doenças ou desvios que podem ser “curados” com terapia, ou práticas, testemunhos e conversões de fé.

As consequências para a saúde psicológica e emocional das pessoas submetidas a tais tratamentos costumam ser devastadoras, mas a prática é comum em diversas comunidades religiosas, e como denunciam Flávio Conrado, Gabriella Morena e Bob Luiz Botelho[5]:

***

“Centenas de igrejas, ministérios e comunidades "terapêuticas" em todo o país continuam usando a prerrogativa de sua liberdade religiosa para ofertar a possibilidade de mudança da sexualidade. Sem base científica e comprovadamente ineficaz, ela causa danos muitas vezes irreparáveis à saúde mental de pessoas LGBTQIA+ o recorrerem ao apoio de suas lideranças religiosas por imaginarem sua sexualidade ou gênero errado ou desordenado.

Profissionais "reversionistas" defendem que "uma pessoa homossexual infeliz com sua sexualidade tem o direito de procurar ajuda", mas este suposto acolhimento guarda, na verdade, uma perniciosa armadilha: quem procura apoio está assolado por dúvidas sobre si, sobre sua fé e com medo de rompimentos na família e na comunidade religiosa. O discurso de ajuda pode soar esperançoso, mas é extremamente violento. Por que tais profissionais não questionam a estrutura de exclusão a que pessoas LGBTQIA+ estão submetidas, contexto onde emerge sua sensação de inadequação, angústia e pedido de mudança?”.

***

Um ano antes da publicação de Descolorindo Eloáh, a prática de reversão sexual por via psicológica foi liberada no Brasil após decisão do juiz federal Waldemar Claudio de Carvalho, da 14ª Vara Federal no Distrito Federal, o que contraria a resolução CFP n° 001/99, de 22 de março de 1999 cujo artigo 3, parágrafo único, determina que “os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades”[6]. Contra a decisão do magistrado, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) entrou no Supremo Tribunal Federal com ação que pedia cassação do disposto pelo juiz da 14ª, o que aconteceu em abril de 2019, depois de uma liminar concedida pelo STF.

Essa é a quarta razão pelo qual Descolorindo Eloáh é relevante ao debate.

A quinta e última é a descrição que Felipe faz do transtorno de disforia de gênero[7] vivido por Eloáh e que lhe causa a sensação de incompatibilidade entre seu sexo anatômico (masculino) e sua identidade de gênero (feminina) e que lhe causa angústia e um sentimento de rejeição a própria imagem.

Felipe só comete alguns deslizes aparentes e que foram primeiro percebido pela minha colega skoober Luisa Leão (ou Diva). Até certo ponto concordo com minha colega em alguns pontos. O primeiro deles é a cura um tanto rápida e quase completa da disforia. De fato, foi pouco realista a forma como as coisas foram feitas. Elóah quase que resolveu sozinha um problema que perdurou anos e que é de tratamento longo com acompanhamento terapêutico.

Segundo, se Eloáh é uma mulher trans (e esse foi o entendimento que eu tive tanto pela sua pergunta se poderia ser menina como a forma como o personagem Luis se refere a ela no fim do livro, usando o feminino), ela não se referiria a si mesma usando o masculino como acontece insistentemente ao longo de toda a obra. Ela poderia até usar o masculino para se comunicar com as outras pessoas diante das circunstâncias difíceis que vivia, mas usaria o feminino ao se referir a si mesma na narração dos fatos.

Talvez tenha faltado um pouco mais de cuidado com os detalhes.

Vamos a crítica literária.

Descolorindo Eloáh como peça literária: minha crítica

Em termos literários, Descolorindo Eloáh revela ainda que Felipe estava ainda na época um pouco “verde”. Um escritor ainda em busca de um estilo próprio ou definitivo.

Uma das coisas que me chamaram a atenção na forma como a narrativa foi pensada, foi algumas escolhas feitas pelo autor, detalhes, coisas até certo ponto irrelevantes, mas algumas delas me pareceram bastante estranhas enquanto outras me encantou pelos significados imbuídos.

A primeira destas miudezas eu já abordei de certa forma: o título da narrativa.

Descolorindo Eloáh tem um significado dentro da história que lhe é não só poético como bastante apropriado. Ao longo do livro, a personagem vai sendo vítima constante de bullying dos colegas da escola, negligência e indiferença dos educadores funcionários, do desamor e crueldade dos pais e da falsa ciência da suposta psicóloga contratada por seu pai. Isso vai, pouco a pouco, minando o mundo da garota, sua autoestima, o seu amor e sua identidade, seu desejo de viver, sua confiança na vida e nas pessoas. “Como um quadro de aquarela barata jogado na chuva ela vai perdendo suas cores, sua vivacidade. Nada mais apropriado do que o título que o autor confere a sua obra.

O segundo detalhe que me chama a atenção é o nome da personagem que também fala muito da mesma.

Eloáh não é exatamente um nome comum e por isso se destaca facilmente, chama a atenção. Mas mais do que isso, há dois outros aspectos peculiares neste nome. Em primeiro lugar, o nome Eloáh, no Brasil, é majoritariamente escolhido para meninas, mas aqui nomeia um personagem de sexo masculino. Além disso é um dos muitos nomes que designam a divindade dos cristãos e dos judeus, que - apesar das muitas representações artísticas insistirem em representá-lo como alguém do sexo masculino, na verdade é uma divindade sem gênero definido e que no passado já foi referido em ambos os gêneros[8].

Não sei até onde Felipe pretendia, mas ele faz aqui uma associação bastante peculiar. Eloáh é uma pessoa trans e todos os seus problemas estão ligados a essa não correspondência entre sexo biológico e o gênero que ela reconhece como seu, e seu nome – visto no Brasil como feminino – é um dos nomes de uma entidade sem gênero definido, pois como a igreja católica mesma já afirmara: Deus não é homem ou mulher, é Deus. Seja como for, o nome escolhido sugere antecipadamente essa ambivalência (?) ou transitoriedade (?) entre gêneros e ao mesmo tempo - e isso é certo - dá a ideia de que a definição binária do gênero é algo que não dá conta da diversidade de identidades existentes na complexidade do que é ser humano.

As outras miudezas revelam algumas fraquezas da escrita do livro.

O primeiro é um problema de estilo. Felipe na época ainda estava amadurecendo seu estilo, por isso, há uma insistência – bastante repetitiva – de concluir ideias e sobretudo capítulos com frases de efeito. Esse tipo de recurso é interessante e em alguns momentos elegante, poético ou reflexivo, mas quando usado em demasia torna-se cansativo.

 O segundo problema é uma questão de desenvolvimento. A narrativa se desenvolve segundo um padrão, uma rotina, o que torna enfadonho e previsível o próximo passo que a trama dará, ainda que o autor sempre acrescente um pequeno elemento a mais em cada novo capítulo.

O ciclo quase sempre é: Eloáh está em casa e enfrenta os problemas familiares; sai de casa e vai para a escola e lá assiste às aulas e enfrenta seus problemas escolares (sempre nas aulas da mesma professora – o que não é nenhum pouco realista, sou professor, posso falar); depois retorna para casa e o ciclo recomeça. Um pouco mais a frente quando avança a narrativa essa rotina ganha mais um acréscimo: as visitas ao consultório da psicóloga e o padrão passa a se repetir com mais este elemento, de modo que o leitor já intui o cenário em que se dará o capítulo seguinte.

Tipo isso: se Eloáh está em casa, no capítulo seguinte estará na escola. Se sai da escola, é provável que irá direto para casa ou para o consultório. E em um desses dois movimentos (na ida ou na volta da escola) certamente encontrará Luís, o vizinho idoso por quem Eloáh cultiva – e por Luís é também cultivado – um misto de piedade e de carinho filial. Em quase a totalidade do livro, Eloáh não escapa disso, não faz grandes desvios, não se aventura pela cidade, não tem um refúgio, um lugar secreto, uma casa na árvore que fosse ou um banco de praça de onde gostasse de olhar o tempo. Ela não tem momentos de loucura, de rebeldia, de fulga! E isso, sério, cansa muito!

Toda narrativa que já li e que fala de jovens e seus problemas existenciais tem, ocasionalmente, grandes mudanças de cenários, momentos de viverem a cidade, a vila, o campo. Há sempre pontos de ruptura com a rotina e isso é um descanso para o leitor. Um ponto a mais para mantê-lo interessado.

Vejo bastante esta fórmula nos animes: há sempre um acampamento, uma ida à praia, um encontro – o famoso dēto suru (デートする) ou só dēto (デート), um festival com hanabi (花火 – fogos de artifícios) e coisas do gênero que ajudam – sem abandonar a essência da narrativa – a lhe dar mais dinamismo, novos cenários, momentos mais suaves antes de situações mais pesadas, tensas ou depressivas. Bons exemplos são: Koe no Katachi (聲の形), conhecido no Brasil como A Voz do Silêncio, que é uma animação que trata de temas delicados como suicídio e bullying; e o j-drama (dorama japonês), Fujoshi, Ukkari Gay ni Kokuru (腐女子、うっかりゲイに告る, algo meio intraduzível para mim), que trata de forma delicada e muito melancólica da homossexualidade masculina na adolescência, do fenômeno Boy Love (BL) e a questão do suicídio em um país ainda muito conservador e preconceituoso.

A história contada por Felipe é potente, é dramática e forte. Eloáh vive em carne viva, e sei que a rotina é um elemento que dá maior realismo a trama, além de figurar o quão esvaziado de sentido se encontrava a vida dela. Mas senti que – literariamente e para os padrões de exigência dos leitores atuais – esse fluxo repetitivo da rotina de Elóah se reproduziu demasiadas vezes, acabando por se tornar um vício da trama. Inclusive, trata-se de um vício tão arraigado que em um dos capítulos o livro apresenta uma falha de continuidade por conta do costume de se seguir o já citado roteiro (casa – escola – consultório – casa).

A falha é minúscula mas não me escapou.

No capítulo 44, após chegar da rua Silas questiona o que a filha foi fazer naquele dia, um sábado (e isso foi bastante enfatizado), e depois há um conflito entre os dois. Eloáh se recolhe ao seu quarto e uma tempestade se instala sobre a cidade. Contudo, no capítulo seguinte, quando o dia amanhece (ou seja, no dia seguinte a briga e que deveria ser domingo), Eloáh acorda e, ao ver o noticiário, agradece pela suspensão das aulas em decorrência do temporal ocorrido durante a noite.

Aula no domingo?” Foi meu questionamento na hora que li, e como o texto não é claro se a suspensão era apenas para aquele ou para vários dias, só pude supor uma falha de continuidade na narrativa.

Felipe ainda tem algumas esquisitices meio estranhas. Uma delas é a escolha do nome da cidade que – apesar dos muitos nomes estranhos de municípios brasileiros – para mim não fez o menor sentido (Cidade de Confete). Outra é o fato da psicóloga usar "cubos de açúcar" (isso existe no Brasil?).

Mas críticas a parte, ele me aparenta ser um talento em desenvolvimento. Ademais, é valido recordar que quer outro escritor que hoje é renomado, um dia foi – na aurora de sua carreira – alguém que escrevia de forma ainda crua, com falhas ou imitando o estilo algum autor ou movimento já consagrado. É plenamente compreensível e nem Machado de Assis escapou disso (leiam Helena – livro chatíssimo e piegas da fase romântica de Machado).

Mas chega! Acho que já deu para entender minha dificuldade de me identificar com a escrita do autor, ainda que eu recomende veementemente a leitura da obra.

Conclusão

Para finalizar gostaria apenas de falar do que achei da construção psicológica de Eloáh e, na tangente, dos personagens de um modo mais generalizado.

De um modo mais geral, alguns personagens foram construídos de uma forma um tanto caricatural ou um pouco sem personalidade, a exemplo de Silas (que é demasiadamente perverso para se fazer completamente crível); do aluno e terror de Eloáh, o playboy Nicolas (que nada mais é que um valentãozinho que se apoia no prestígio de sua família e na permissividade interesseira da direção da escola); da psicóloga picareta Elisa (que é um pouco sem personalidade, mas que me fez crer que os órgãos de regulamentação da profissão deveriam ficar mais atentos aos profissionais em exercício); e da mãe dominada – e um tanto marionete – de Eloáh (que encarna o papel clássico de mulher muda e dominada, vítima e cúmplice da violência perpetrada em casa).

Qualquer um deles poderiam ser reais? Acredito que sim, porque personificam realidades de fato: hipocrisias religiosas, violência doméstica, clientelismo, privilégios sociais, picaretagem de falsos médicos e mulheres que “por amor” se silenciam frente a violência contra elas e contra seus filhos. No entanto, não consegui ver muita profundidade e complexidade nestes personagens. Eles são reflexos da realidade, mas não me pareceram de fato reais. Eloáh, no entanto, me convenceu muito mais.

Eloáh é repleta de medos, frustrações, complexos, receios, desejos e dores. Uma miscelânea de sentimentos. E mais do que isso, ela é sensível, e não apenas porque consegue sentir no ar as tensões entre seus pais, a hipocrisia e a transfobia nas ações e falas de seu pai ou porque lê o preconceito estampado nos olhares dos moradores da Cidade de Confete ou na crueldade de seus colegas de turma. Não. Eloáh é sensível sobretudo porque ainda preserva dentro de si a força para ser gentil mesmo com quem negligencia o seu bem-estar (a mãe), ou com aqueles que só necessitam de um pouco de atenção (Luís, o vizinho idoso e viúvo que remói a perda da esposa).

Eloáh não sabe lidar muito bem com o afeto e atenção que Samuel (único amigo de Eloáh, negro, homossexual[?] e que se torna o principal porto seguro da garota), que Lilian (professora nova de língua portuguesa) ou mesmo que Luís lhe ofertam – porque só conheceu a dor e a violência onde deveria haver carinho e proteção. Mas ainda assim, consegue manter parte de si íntegra, amorosa, yasashī (やさしい)[9].

Isso não quer dizer que ela não guarde dentro de si sentimento de revolta, de raiva, mas o que mais transborda por seus poros é uma sensação de cansaço misturado a aflição que lhe faz flertar com o suicídio. Mas em meio a esta névoa, Eloáh é fundamentalmente uma jovem capaz de pequenos e belos atos de gentileza. Tudo isso a torna bem mais complexa do que aparenta e isso me fez me identificar bem mais com ela do que com a maioria dos protagonistas de sua vida.

Enfim, penso que Felipe tem futuro e provavelmente seu livro mais recente, Para onde vão os Suicidas?, deve corrigir parte das limitações que percebi em Descolorindo Eloáh, porque todo autor é um escritor em construção. Gostaria apenas de pontuar que achei o desfecho (epílogo) um pouco exagerado. Havia como dar destino a Silas de outra forma, com resultado semelhante, porém mais crível. E senti falta de um “o que aconteceu depois” mais detalhado no caso da protagonista.

Ademais, independente de minhas críticas, o livro é importante, sua leitura é necessária, principalmente como porta de entrada para conhecer o tema da transgeneridade em sua relação com os conflitos familiares, religiosos, sociais e psicológicos. Importante também porque denuncia a falsidade dos tratamentos que prometem a “cura” de algo que não é doença, não é pecaminoso e muito menos anormal.

A edição lida é da Editora Pendragon, do ano de 2019, digital, e sua versão física possui 242 páginas.

Sobre o autor

Felipe Saraiça é vencedor do prêmio Pérolas da literatura e escreve desde 2016. É autor de Palavras de rua — que foi adaptado para o cinema —, Para onde vão os suicidas, Descolorindo Eloáh e o livro de poemas O amor é um plágio. Já quis ser jogador de futebol, cantor, mas acabou se encontrando verdadeiramente na literatura, um sonho que surgiu de forma repentina, mas se tornou parte essencial da sua vida. Aborda assuntos delicados em suas narrativas e acredita que os livros têm o poder de transformar as pessoas. Também ganhou o Festival de Cinema de Caruaru com o longa-metragem baseado em seu primeiro livro, ao qual escreveu o roteiro junto ao produtor Léo Batista.

Preview do Google Books

Abaixo você pode conferir uma prévia do livro disponível no Google Books.

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[4] MESQUITA, Daniele Trindade; PERUCCHI, Juliana. Não apenas em nome de Deus: discursos religiosos sobre homossexualidade. Psicologia & Sociedade [online]. 2016, v. 28, n., pp. 105-114. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/1807-03102015v28n1p105>. Acesso em: 18 jan 2022.

[9] Desculpem-me por recorrer a um termo estrangeiro, mas é que o entendimento japonês do que é ser gentil traduz com mais fidelidade meus sentimentos e impressões em relação ao desenho psicológico do personagem. Sei que pouquíssimos conseguirão compreender-me usando este termo – yasashī – mas para os japoneses ela descreve a pessoa que é dotada de compaixão pelos outros, de sentimentos delicados, de modéstia, de humildade, de bondade, de suavidade ou algo que possui uma natureza refrescante e graciosa.

domingo, 7 de março de 2021

Eu e Você – Niccolò Ammaniti – Resenha

Por Eric Silva para a 4ª Campanha Anual de Literatura do Conhecer Tudo

7 de março de 2021, ano da Itália

“O mimetismo batesiano se verifica quando uma espécie animal inócua, aproveitando sua semelhança com uma espécie tóxica ou venenosa que vive no mesmo território, consegue imitar a cor e os comportamentos dessa última. Assim, na mente dos predadores, a espécie imitadora é associada à perigosa, o que aumenta suas possibilidades de sobrevivência”.

(Niccolò Ammaniti, epígrafe)

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Um livro que explora a natureza humana quando esta é forçada a se adequar ao meio e que aborda a transição da adolescência para a idade adulta, Eu e Você, do italiano Niccolò Ammaniti, é um livro sensível que aborda as dificuldades de um garoto calado e antissocial em interagir de forma honesta e sincera com o mundo, mas que é confrontado pelo destino e posto à prova quando forçado a conviver, mesmo que temporariamente, com sua meia-irmã problemática e viciada em narcóticos.

Confira a resenha do terceiro livro da IV Campanha Anual de Literatura do Conhecer Tudo que neste ano homenageia a literatura italiana.

Sinopse do enredo

Roma, fevereiro de 2000. Munido de comida, bebida, livros e jogos, Lorenzo Cuni está escondido no porão de seu prédio, rodeado de objetos empoeirados de uma condessa morta, esperando que a semana branca (settimana bianca) acabe e ele possa enfim retornar para o andar de cima e contar para a mãe o quão divertido foi passar aqueles dias esquiando nos alpes italianos com seus amigos.

Mentir e esconder-se ali era a única opção depois que ele inventou uma viagem que não existia com amigos que ele nem se quer conhecia. Uma maneira louca de fugir da perseguição dos pais que queriam que ele tivesse amizades.

Tudo parecia dar certo. Ele conseguiu enganar os pais em relação a viagem, e conseguiu despistar a mãe quando esta queria levá-lo ao ponto de encontro com os tais amigos. Depois disso, conseguiu se instalar secretamente em seu refúgio sem grandes esforços. Apesar disso, ele não contava que um segundo elemento se introduziria em seus planos: a meia irmã Olivia, com a qual Lorenzo quase não teve nenhum contato e que era viciada em drogas.

Naquele justo momento, Olivia aparece em busca de algumas coisas pessoais no porão da casa do pai, de algum dinheiro e de um lugar para “ficar limpa”, ou seja, para esperar passar o tempo de abstinência dos narcóticos que usava. Sob coerção, Lorenzo se vê obrigado a “hospedar” a irmã em seu refúgio secreto e, por vários dias, conviver com ela, uma quase desconhecida. É assim que Olivia se soma a equação de Eu e Você, e à vida do jovem Lorenzo.

Resenha

Quando comprei Eu e Você, em 2019, de planos fazer naquele ano a quarta edição da CALCT, fiquei um tanto receoso porque a capa e o título sugerem mais um daqueles romances de amor adolescente e dramático. Todavia o livro de Niccolò Ammaniti vai para um caminho totalmente oposto, e se ainda assim Eu e Você (no original, Io e Te) seja um tanto dramático, é um livro sem muito romantismo, cheio de originalidade e que conseguiu me agradar com seus personagens, sua narrativa e sua leitura ágil e descomplicada.

Li numa resenha que este livro promete pouco e entrega pouco, mas para mim, esse “pouco” foi mais do que o suficiente. É claro que Eu e Você não explora as belas paisagens italianas ou os cenários romanos seculares, mas, por outro lado, explora um pouco da natureza humana daqueles que são deslocados. O próprio protagonista e narrador é daquelas almas egocêntricas que preferem a solitude de estar em sua própria companhia porque considera que não há nenhuma outra associação melhor, mas que se vê – por atrito – forçado a amadurecer. A outra protagonista é uma pessoa destruída pelo desprezo de seus pares e pelo vício das drogas. Alguém desajustado, que mesmo não estando à espera de que alguém lhe estenda a mão, luta com suas próprias forças para encontrar um caminho.

Ammaniti parece gostar dos romances dramáticos e de família, a exemplo do seu elogiado Como Deus Manda (Come Dio Comanda), onde os dois protagonistas, pai e filho, vivem uma relação baseada na violência e no conflito. Eu e Você é mais suave, mas possui seus próprios tons dramáticos. A temática sobre as drogas já se tornou corriqueira – afinal, mais do que nunca, o uso de drogas se tornou um fato universal –, mas está em perfeito equilíbrio com a proposta e nível do livro. Ainda assim, ele foi bom o suficiente para garantir uma adaptação para o cinema realizado em 2012 por Bernardo Bertolucci e que rendeu várias indicações para o Prêmio David di Donatello.

A escrita de Ammaniti é ágil, leve e sucinta sem deixar de ser descritiva e bem escrita. É prosaica, mas não destituídas de alguma poesia. Há um equilíbrio entre diálogo e narração, e o narrador, por sua personalidade individualista é irônico e opinativo. Mas o interessante nesse livro é o choque existente entre duas gerações de irmãos tão distintos entre si. Ele amado e mimado, ela ovelha negra, perdida, indesejada. Desse choque nasce uma novela interessante, ainda que limitada. Mas o que quero mesmo é destacar seus personagens muito bem-feitos.

Lorenzo é um personagem tão peculiar quanto interessante. Ele é um ator nato e o meio termo entre um adolescente esnobe e malcriado, mas sensível, e o futuro projeto de um manipulador taciturno, antissocial e calculista, mas que não se concretiza. Observador, inteligente, e egocêntrico, mas pouco dado a conversar com aqueles que não faziam parte de seu círculo familiar. Só a mãe, o pai e a avó lhe importavam.

Os pais se preocupam com a pouca sociabilidade do filho. Quando era pequeno, Lorenzo só respondia aos estranhos com “sim, não, e não sei”, e se insistissem, dizia aquilo que eles queriam ouvir. Quando “os outros” não o deixavam em paz, se tornava agressivo e, por isso, os pais preocupados o mandaram para um psicólogo, que o menino tratou logo de tentar enganar, fazendo-se passar por um “menino normal”. Contudo o diagnóstico não poderia ser ao mais exato: Lorenzo era “incapaz de sentir empatia pelos outros”, “[...] tudo que está fora de seu círculo afetivo não existe, não lhe suscita nada” e “acredita que é especial e que apenas pessoas especiais como ele podem compreendê-lo”.

Os pais, obviamente, desacreditaram deste diagnóstico e tiraram o menino do tratamento. Para eles, o filho era “afetuoso”, “um menino normal”. No entanto, aquela decisão foi a chave para que Lorenzo aprendesse a dissimular, fingir ser quem não era para que as pessoas o deixassem em paz. Se misturava com os outros jovens numa distância segura o suficiente para que eles e os pais pensassem que ele era um “deles”, que tinha amigos, e longe o suficiente para não ser importunado. Como um inseto havia aprendido a mimetizar.

“Eu me misturava como uma sardinha em um cardume de sardinhas, me mimetizava como um bicho-pau entre ramos secos”.

Contudo, ao entrar no liceu[1] público a técnica deixa de ser eficiente e ele se torna alvo de bullying. O que lhe resta é evoluir, não como pessoa, mas como imitador, e é através da imitação das práticas e trejeitos dos mais temidos da escola que ele consegue afastar todo os indesejáveis. Ele passava a ser uma mosca que imitava as vespas.

“Em algum lugar, nos trópicos, vive uma mosca que imita as vespas. Tem quatro asas, como todas as de sua espécie, mas mantém uma sobre a outra, e assim parecem apenas duas. Tem listras amarelas e pretas no abdome, antenas, olhos protuberantes e até um ferrão de mentira. Não faz nada, é boazinha. Mas, vestida como uma vespa, é temida pelas aves, pelas lagartixas, até pelos seres humanos. Pode entrar tranquilamente nos vespeiros, um dos lugares mais perigosos e vigiados do mundo, e ninguém a reconhece.

Eu tinha errado tudo.

Era isso que eu devia fazer.

Imitar os mais perigosos”.

 

Desse modo, Lorenzo continuava sozinho e isolado. Sentia-se feliz sozinho, mas ao lado dos outros tinha que representar, o que chegava a amedrontá-lo. Além disso, inventava mentiras e casos engraçados da escola para deixar os pais tranquilos. Foi nesse círculo interminável de mentiras e dissimulações que ele acabou por inventar que alguns amigos haviam o convidado para esquiar e teve que buscar uma maneira de sustentar sua mentira. Nesse ponto começa de fato a história do livro.

[ALERTA DE SPOILER]. Olivia por sua vez é pintada pelo narrador sob as cores da irmã-mistério, desconhecida, inoportuna, indesejada, inteligente e boa mentirosa, mas, ao mesmo tempo, objeto de uma curiosidade pouco confessada e que ao olhar do irmão vai pouco a pouco se transformando, pela força da convivência forçada, como alguém em mutação.

[ALERTA DE SPOILER]. Ela, por sua vez, oscila da indiferença a curiosidade, das pequenas implicâncias a solidariedade fraternal que quebra lentamente o iceberg em que Lorenzo estava preso. Na maioria do tempo padece dos efeitos da abstinência, mas, nas suas falas, é possível perceber o ressentimento que nutria do pai e da madrasta.

É interessante notar que Olivia na história funciona como o ponto de pressão de Oliver, forçando-o a abandonar seu egocentrismo para ajudá-la em um momento em que ela se encontra extremante vulnerável e doente.

[ALERTA DE SPOILER]. Eles dois não conviveram, mal se conheciam, e se viram em pouquíssimas oportunidades, mas a relação irmão e irmã, com seus altos e baixos, birras e solidariedades está ali, explícita, palpável. E desse modo aquele breve tempo juntos acaba por impulsionar o lado mais humano do garoto e contribui para seu crescimento e amadurecimento por forçá-lo a deixar de olhar para si, para olhar para o outro. Uma temporada breve, mas significativa ao ponto de levar o menino a ampliar seu círculo afetivo outrora tão estreito.

Enfim, o desfecho é singelo e muito sensível, sem deixar de ser, até certo ponto, realista e verossímil. O livro como um todo não é um clássico, e rapidamente caiu no esquecimento, mas tem qualidade e te prende, sendo, em parte, até comovente.

A edição lida é da Editora Bertrand Brasil, do ano de 2013 e possui 160 páginas.

Sobre o autor


Niccolò Ammaniti nasceu em Roma e é um dos mais conceituados autores italianos da atualidade. Os seus livros são sucessos de vendas internacionais e estão publicados em quarenta e quatro países. Escreveu os romances Branchie, Ti prendo e ti porto via e Não tenho medo, além da antologia de contos Fango. Como Deus Manda recebeu o prêmio Strega, mais importante e disputado da literatura italiana. A Festa do Século, seu livro seguinte, demonstra todo o talento do autor por meio de uma crítica tão criativa quanto impiedosa à sociedade. Com Eu E Você, Ammaniti comprova a versatilidade literária que o levou a ser traduzido para mais de quarenta idiomas.

Confira quem são os outros autores participantes da Campanha deste ano.

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Preview do Google Books

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domingo, 7 de fevereiro de 2021

Um Amor Incômodo – Elena Ferrante – Resenha

Por Eric Silva para a 4ª Campanha Anual de Literatura do Conhecer Tudo

07 de fevereiro de 2021, ano da Itália

“Talvez eu quisesse tentar estabelecer entre nós uma intimidade que nunca existira, talvez eu quisesse confusamente fazer com que ela soubesse que eu sempre fora infeliz.”

(Elena Ferrante – Um Amor Incômodo)

Nota: todos os termos com números entre colchetes [1] possuem uma nota de rodapé sempre no final da postagem, logo após as mídias, prévias, banners ou postagens relacionadas.

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Edição Brasileira, pela editora Intrínseca. Preço de capa: R$ 39,90
Livro de estreia da celebrada e misteriosa escritora italiana Elena Ferrante Um Amor Incômodo é um livro um pouco monótono, mas que aborda a violência doméstica de forma autêntica e complexa. Uma narrativa crua, de personagens marcantes, sentimentos intensos e conflitivos e que trabalha com o onírico e com a memória.

Confira a resenha do segundo livro da IV Campanha Anual de Literatura do Conhecer Tudo que neste ano homenageia a literatura italiana.

 

Sinopse do enredo

Delia é uma desenhista de quadrinhos que abandonou sua cidade natal, Nápoles, para fugir do seu passado e da relação complicada que possuía com sua família. A única pessoa com quem a desenhista mantinha proximidade era com Amalia, sua mãe, que frequentemente ia a Roma visitá-la. Entretanto, mesmo essa presença um pouco constante da mãe era indesejada e incômoda a Delia, até o dia que Amalia é encontrada morta em uma praia em circunstâncias misteriosas: seminua, vestida apenas com um sutiã de grife.

A morte inesperada da mãe obriga Delia a retornar à Nápoles e enfrentar novamente o seu passado marcado pela violência doméstica causada pelos rompantes de raiva e ciúmes obsessivo de seu pai. Nessa viagem de volta ao passado, ao mesmo tempo em que busca lidar com a perda da mãe, a quadrinista se vê diante do desafio de buscar preencher as lacunas do passado, encarar os fortes sentimentos que Amalia lhe provocava e descobrir como ocorreu a sua morte. Mas é principalmente a figura do suposto amente da mãe, Caserta, que persegue as lembranças do passado e também o presente de Delia.

Entorno da figura de Amalia e Caserta gira a curiosidade e o desejo sôfrego de Delia de compreender o que de fato havia acontecido entre os dois no passado, provocando na italiana a reflexão dos fatos que se deram em sua infância e que levaram a deterioração da sua relação com a mãe e também com o pai.

Resenha

Elena Ferrante é uma das mais curiosas escritoras italianas que já ouvi falar. Não só por conta do sucesso de sua obra composta de nove livros – todos já publicados no Brasil – como também pelo mistério que envolve sua identidade, segredo este que já rendeu investigações e polêmicas na Itália há alguns anos.

Nunca havia lido nada de Ferrante apesar do sucesso da escritora entre os leitores brasileiros, mas resolvi fazê-lo por conta da IV Campanha Anual de Literatura, que nesse ano homenageia a literatura italiana. Por força desse fator, decidi ter meu primeiro contato com a obra da escritora a partir de seu livro de estreia Um Amor Incômodo (L’amore molesto), que segundo dizem os leitores assíduos da italiana é um livro ainda da fase pouco madura da escritora e, logo, ainda um pouco distante da sua escrita atual.

Um Amor Incômodo é um livro intimista e com uma caraga dramática pesada, mas que aborda com muita sensibilidade os desdobramentos emocionais na vida adulta de uma infância marcada pela violência doméstica.

Publicado em 1992, a obra foi adaptada em filme homônimo pelo cineasta Mario Martone em 1995, mas só em 2017 o livro foi publicado no Brasil.

O enredo conta a história de Delia, uma quadrinista quadragenária, profissionalmente realizada, mas emocionalmente abalada pelo passado familiar, o que imprime em seu comportamento um forte desejo de distanciamento dos seus familiares.

Delia (interpretada por Anna Bonaiuto). Cena do filme L'amore Molesto (1995).

Delia é o tipo de personagem introspectivo que se perde bastante nos próprios sentimentos e pensamentos. Como a história se passa no momento em que ela tenta lidar e processar a perda da mãe encontrada afogada no dia do aniversário da filha, durante grande parte da narrativa, Delia divaga sobre o passado e vai, ao mesmo tempo, reconstruindo a linha histórica de lembranças e memórias não muito confiáveis. Essa reconstrução é importantíssima na trama, porque nos revela o passado da protagonista ao mesmo tempo que, por um lado, nos elucida as circunstâncias que fizeram sua relação com a mãe se tornar insustentável e, por outro, desvenda os últimos passos de Amalia antes de ser encontrada morta.

Vista da cidade de Nápoles com Vesúvio ao fundo. Nápoles é o principal cenário do livro de Ferrante. Imagem de Damirux. Wikimedia Commons.


O enredo em si é esse reencontro da protagonista com o seu passado
, com ela mesma e com as lembranças de sua relação com a mãe. Mas mesmo sendo conturbada essa relação entre mãe e filha, é ela que dá forma e norte a personalidade da protagonista que inicialmente demonstra uma aversão quase que instintiva e bastante intensa pela presença de Amalia, chegando a se sentir um tanto aliviada com a morte de sua progenitora. No entanto, gradativamente vai se revelando que, na verdade, essa aversão é fruto de um sentimento frustrado e infantil de desejo de simbiose, ou melhor dizendo, de querer ser a mãe, fundir-se e confundir-se com a personalidade materna, como também observa Aline Aimee. Daí vem o título do livro. O amor de Dalia por Amalia era tão cheio de marcas, complexos e sentimentos conflitantes que ele se tornava incômodo, angustiante, sofrido.
A principal marca da personagem principal na narrativa é sua difícil relação com a mãe. Delia analisa e reconstrói essa relação a partir das memórias que possui de sua infância com Amalia, o pai, o tio e os vizinhos: Caserta, o menino Antonio e o avô confeiteiro de Antonio. Ao mesmo tempo ela envereda numa busca por reconstituir os últimos acontecimentos vividos por Amalia, como sua reaproximação com o suposto amante do passado, Caserta, e também fechar as lacunas que explicariam as circunstâncias de sua morte.

A minha opinião sobre a personagem principal é que ela não é a figura mais importante de sua própria história e perde um pouco de seu protagonismo para a figura da mãe, personagem forte e dúbio e que, por isso, me faz lembrar de outra personagem feminina: Capitu, do livro Dom Casmurro, obra icônica do escritor brasileiro Machado de Assis.

Amalia, cuja morte é o motivo de existir enredo, rouba a cena por ser uma personagem difícil de precisar e de descrever, mas que ao mesmo tempo é a cola que une todo o elenco do livro e os fios de sua trama. Sem ela, simplesmente, não existiria história.

Amalia jovem, interpretada por Licia Maglietta (1995).

Em sua juventude, a mãe de Delia é descrita por Ferrante como uma mulher bonita, risonha e provocante, que buscava preservar o bom humor e o gosto pela vida, mesmo vivendo em um ambiente sufocante e marcado pela violência. Casada com um pintor fracassado que sobrevivia com a venda de pinturas baratas de temas vulgares, Amalia sofria constantemente com as agressões do marido extremamente ciumento e que sempre a agredia. Mesmo em ambientes públicos, quando algum homem se dirigia a ela e a mesma esboçava algum tipo de simpatia, Amalia costumava ser vítima das agressões. Os abusos também eram muito comuns por conta dos constantes presentes que Amalia recebia do vizinho Caserta que era sócio de seu marido nos negócios de vendas de pinturas.

Desse modo, o tema da violência doméstica se torna um elemento imprescindível da história escrita por Ferrante e dá a narrativa um caráter bastante realista. As lembranças de Delia são profundamente marcadas pelas cenas de violência protagonizadas pelo pai e, por isso, o tema funciona como elemento crucial na formação da personalidade da protagonista. O resultado é que o desenho psicológico de Delia é bastante conturbado e atravessado pelo produto de um passado marcado de um lado pela frustração e nunca conseguir se igualar a figura materna, e de outro pela violência doméstica da qual ela foi testemunha e em um dado momento foi também impulsionadora.

Cenas do filme L'Amore Molesto de Mario Martone (1995) 
e que retratam a violência doméstica sofrida por Amalia.

Outros dois personagens importantes na trama são o tio Filippo, irmão de Amalia e que em vez de defendê-la das agressões a culpava por elas, e Caserta, outro personagem enigmático da trama e que sustenta a narrativa junto com as lembranças de Amalia conservadas por Delia.

Filippo é um homem tosco e irritadiço. Na maior parte do tempo fica xingando no dialeto local e falando mal de Amalia, a culpando por destruir o próprio casamento por seu comportamento, na visão dele, bastante reprovável. Ele junto com o pai de Delia representam na narrativa a figura do homem machista que vê na mulher a reencarnação da devassidão e da pecaminosidade, devendo ser corrigida a sua inclinação inevitável para a infidelidade com pancadas. 

Caserta é descrito no livro como um homem “esperto, de pele escura como um sarraceno, mas com olhos de diabo assanhado”, tinha fama de importunar as mulheres do bairro e desde a infância sua imagem causava a Delia uma mistura conflitante de atração, repulsa e medo. Este não era seu nome, mas um apelido.

Discussão entre Caserta (camiseta branca - por Enzo De Caro), Filippo (com a arma - Francesco Paolantoni) e o pai de Delia (à esquerda - Italo Celoro) em cena de flashback do filme L'amore Molesto (1995).

Na época, o pai da menina já era um pintor medíocre que pintava por ninharias, foi Caserta quem percebeu a possibilidade de que ele ganhasse um pouco mais pintando retratos a óleo das mães, irmãs e namoradas dos marinheiros americanos com saudades de casa. O negócio com Caserta porém de se desfez depois que o pai de Delia achou uma proposta mais vantajosa, pintando imagens de ciganas. Amalia se opôs e daí em diante as brigas entre o casal por conta de Caserta começaram, se tornando pior quando Delia lançou ao pai a semente da desconfiança de uma possível traição. Filippo e o cunhado quase mataram Caserta e seu filho, obrigando-o a fugir com sua família.

Passados todos aqueles anos Caserta ainda era um nome envolto em mistério, e de alguma forma ele estava ligado aos últimos dias de vida de Amalia. Delia não sabia como nem porque, mas o mistério daquele homem asqueroso a atraía.

A título de conclusão...

Apesar de ser uma narrativa na qual a narradora reflete bastante sobre cenas e episódios ocorridos no passado, Ferrante usa de uma narração linear e não recorre a flashbacks. Delia narra os hábitos, as brigas, os fatos, os lugares e as pessoas, mas não perde a sua condição de narradora quando evoca o passado. Por conta disso, ela acaba por caminhando pela linha tênue entre os acontecimentos do passado e o presente, como se o passado fosse imagens fantasmagóricas que a quadrinista vislumbra sobrepostas às imagens do presente. Por isso, não é incomum que sonho, lembrança e realidade se fundam na mente da narradora e ela chegue até mesmo a ter visões, sobretudo da mãe.

Ferrante escreve um livro de atmosfera intimista e psicológica muito marcante. Lembranças, divagações e fantasias da protagonista se misturam, mostrando que muitas das respostas que ela buscava já estavam guardadas em seu subconsciente, e seria o contato que ela faz com todas aquelas pessoas do passado o fator responsável por trazer gradativamente à tona as lembranças mais escondidas.  Desse modo, o tom que percebi dominar na obra foi a da confusão de sentimentos, pensamentos e lembranças que emanam de Delia e que conduzem a personagem em um encontro com seu passado, recuperando cenas e enredos esquecidos e deformados com o passar do tempo.

Enfim, achei o livro monótono, mas a forma como Ferrante aborda a violência doméstica através das lembranças um tanto inconsistentes da protagonista e os complexos e aversões que ela desenvolveu no processo foi excepcionalmente autêntico e até mesmo complexo. Ademais, Um Amor Incômodo é uma narrativa crua, de sentimentos muitos intensos e conflitivos e que trabalha com o onírico e com a memória. Possui personagens muito marcantes, cujos sentimentos e ações nos fazem questionar muito sobre a natureza humana.

Muitos afirmam, que este livro não é o melhor de Elena, mas como minha primeira experiência com a autora, não farei julgamento de valor. Além disso, é sabido de qualquer leitor experimentado que livros de estreia quase sempre são reflexos de um escritor ainda em formação, ainda cru e em processo de aperfeiçoamento. Justamente por isso é interessante ler estes livros, porque eles meio que humanizam aqueles que se encontram no panteão da literatura internacional.

A edição lida é da Editora Intrínseca, do ano de 2017 e possui 176 páginas.

Sobre o autor

Elena Ferrante é o pseudônimo de uma escritora italiana que prefere manter sua identidade em segredo sob a justificativo poder escrever com liberdade, e para que a recepção de seus livros não seja influenciada por uma imagem pública. Especula-se que seja uma tradutora, Anita Raja, que nasceu em Nápoles e que seja casada com o também escritor Domenico Starnone.

A autora concede poucas entrevistas, todas elas por escrito e intermediadas pelas suas editoras italianas. A única certeza sobre ela é que escreve desde 1991, ano em que publicou seu primeiro romance, L'amore molesto, livro resenhado nesta postagem.

Confira quem são os outros autores participantes da Campanha deste ano.

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